O ministro deu a decisão em caráter liminar (provisório) na quarta-feira (8), a pedido da PGR, que relatou ao Supremo ter enfrentado “resistência ao compartilhamento e à supervisão de informações” dos procuradores da República.
A Procuradoria-Geral ainda relatou ao STF que há suspeita de a Lava Jato estar burlando a lei para investigar o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), que têm foro privilegiado e deveriam ter eventuais suspeitas submetidas à análise inicial da corte.
O processo está sob sigilo e, por se tratar da Lava Jato, o relator do caso é o ministro Edson Fachin.
Antecipada nesta quinta (9) pela Folha de S.Paulo, a decisão foi dada por Toffoli porque, por ser o presidente, ele responde pela corte durante o plantão do Judiciário, que está em recesso.
Geralmente, as decisões monocráticas dos ministros são submetidas ao plenário do Supremo. Esse caso pode suscitar uma discussão no STF sobre os limites dos poderes das forças-tarefas do MPF.
A disputa entre a cúpula da Procuradoria-Geral e a força-tarefa em primeira instância tornou-se pública após visita a Curitiba no fim de junho da subprocuradora Lindora Araújo, coordenadora da Lava Jato na PGR e uma das principais auxiliares do chefe da instituição, Augusto Aras.
Os procuradores a acusaram de tentar manobrar para ter acesso a bancos sigilosos de maneira informal e sem apresentar documentos ou justificativas para a tomada dessa providência. Uma reclamação foi encaminhada à corregedoria do MPF.
A PGR, por sua vez, apresentou ação ao STF na qual relata que expediu um ofício às forças-tarefas do MPF nas três capitais “com o objetivo de obter as bases da dados estruturados e não estruturados utilizadas” pelos investigadores. Porém os procuradores se negaram a atender a solicitação.
A Procuradoria-Geral sustenta que as informações serviriam para subsidiar a atuação de Augusto Aras, o que inclui zelar pelo efetivo respeito aos poderes públicos e coordenar as atividades do MPF, decidindo eventualmente sobre qual esfera toca determinadas investigações.
A peça é assinada pelo vice-procurador-geral da República, Humberto Jacques.
Ao dar decisão favorável, Toffoli ressaltou que a postura da Lava Jato viola o princípio da unidade do Ministério Público, além de ferir a competência do Supremo para supervisionar investigações relativas a autoridades com foro.
Segundo a PGR, há “elementos de informação em trânsito na Lava Jato” relativo aos presidentes da Câmara e do Senado “cujos nomes foram artificialmente reduzidos em tabelas acostadas à denúncia apresentada ao Juízo da 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba”.
Assim, diz Toffoli, é necessário impedir essa investigação “no seu nascedouro”.
– Aliás, o que se busca garantir, além da preservação da competência constitucional da corte, é o transcurso da investigação sob supervisão da autoridade judiciária competente, de modo a assegurar sua higidez – disse.
O presidente do Supremo aponta que é evidente a necessidade do “imediato intercâmbio institucional de informações, para oportunizar ao Procurador-Geral da República o exame minucioso da base dados estruturados e não-estruturados colhidas nas investigações”.
Jacques afirma que a Lava Jato ofereceu “resistência ao compartilhamento, ao intercâmbio e à supervisão das informações que são retidas em bases compartimentadas e estanques, invisíveis ao conjunto do Ministério Público”.
Toffoli argumenta que o Ministério Público “compõe um todo intrinsecamente indivisível, sendo sua repartição em órgãos e a subordinação administrativa a coordenadores diversos justificadas apenas pela necessidade de organização administrativa e funcional que assegure à instituição a defesa dos interesses difusos e coletivos em todo o território nacional”.
O ministro destaca que o PGR tem competência para requisitar as informações.
– Não obstante, a sua direção única pertence ao procurador-geral, que, hierarquicamente, detém competência administrativa para requisitar o intercâmbio institucional de informações, para bem e fielmente cumprir suas atribuições finalísticas, como, por exemplo, zelar pela competência constitucional do Supremo Tribunal Federal, na qualidade de fiscal da correta aplicação da lei e da Constituição – apontou.
Toffoli afirma que a jurisprudência atual do Supremo prevê esse tipo de compartilhamento de dados dentro do mesmo órgão.
Ele escreveu que o “princípio constitucional da unidade do Ministério Público”, estabelecido no artigo 127 da Constituição, “recentemente reafirmado pelo plenário no julgamento da ação de relatoria do ministro Alexandre de Moraes”, assegura “o intercâmbio de dados dentro da mesma instituição ministerial (MPF), entre unidades menores e o procurador-geral da República, chefe da instituição”.
Na resposta ao ofício da PGR, a força-tarefa de Curitiba, onde nasceu a operação, afirmou que o pedido sem distinção de acesso entre as bases protegidas ou não por sigilo judicial e questões logísticas impediam atender à solicitação.
Os procuradores do Rio de Janeiro, por sua vez, disseram que, para responder ao ofício, seria necessário “submeter pedidos específicos à Justiça, para que fosse pleiteado na forma da lei e da jurisprudência o compartilhamento de dados do processo ao qual se pretende ter acesso”.
Já São Paulo se limitou a dizer que seria “impossível atender à requisição” por “motivos de amplo conhecimento” de Aras.
Toffoli, porém, afirmou que as respostas, apesar de “desencontradas”, evidenciam o claro desrespeito ao princípio constitucional da unidade do Ministério Público.
– Já externei compreensão de que Ministério Público -em que pese a irradiação de suas atribuições sobre distintos órgãos- é instituição una, nacional e de essência indivisível, e como tal, conta com órgão central que é o procurador-geral da República – argumentou Toffoli.
O presidente do Supremo é um dos principais críticos dos métodos da Lava Jato na corte, tendo sido o responsável por decisões que contrariaram os interesses das forças-tarefas na primeira instância.
A força-tarefa do Rio disse que “vai tomar as providências para cumprir na íntegra a decisão monocrática […], embora entenda a decisão incabível e buscará sua revisão”. As demais ainda não se pronunciaram sobre a ordem do ministro.
Na última segunda-feira (6), o coordenador da equipe de Curitiba, Deltan Dallagnol, criticou o acesso indiscriminado a informações sigilosas, como defendido por Aras.
– O chefe da Receita Federal não tem o direito de ver o Imposto de Renda de um certo contribuinte, e o banqueiro não deve acessar os detalhes dos gastos de um correntista, sem justificativa – disse.